Editorial

Há esperança para o micronacionalismo?
Essa pergunta nos faz refletir profundamente. Quando pela primeira vez a mesma micronação cruza a barreira dos dez anos – uma vez que a Porto Claro de Aguiar encerrou suas atividades exatamente em seu décimo aniversário – perguntamo-nos se há esperança para o resurgimento do micronacionalismo. Pessoalmente, responderia: para o micronacionalismo que funciona do modo em que conhecemos, não.Se insistirmos no velho, seremos uma analogia a um antigo conhecido dos primórdios da Internet: o IRC. Este último, hoje se restringe a poucos #canais, um pequeno grupo em poucos servidores. Não é isso que vemos? Um grupo que aqui está há muito tempo cada vez a se concentrar em um número menor de micronações. Como defendo, nossa prática deve se adaptar aos novos tempos: às novas tecnologias e ao amadurecimento da concepção do ser micronacional.

Outrora eu mesmo disse: o micronacionalismo morreu. Mantenho: o [velho] micronacionalismo morreu.

Vamos conseguir fazer a transição? Esta pergunta é muito mais difícil de ser respondida que a primeira. Tudo dependerá dos atores que têm relevância no cenário micronacional – ou daqueles que Cava denominava de extraordinários. Como Aron afirmava, estes se dividem em extraordinários revolucionários e extraordinários reacionários. Este é o cenário: aqueles que se prenderão ao velho e aqueles que sentirão as mudanças dos tempos.

 

Pensamento socioculturalista

As duas revoluções – Carlos Góes. (reeditado)
O micronacionalismo contemporâneo necessita de duas revoluções: uma teleológica e outra tecnológica.
A primeira, passa pela construção de um verdadeiro nacionalismo popular – ex partis populis – que, por meio da lenta lapidação de uma cultura comum – com doutrinas, normas de procedimento, artefatos, símbolos, métodos e costumes -, gere os laços imaginários de identidade nacional que faltam para dar razão ao fragmento -nacionalismo do [micro-]nacionalismo. Este é processo extremamente complexo, pois a construção de vínculos nacionais interpessoais leva algum tempo e, ademais, o aspecto voluntarista do nacionalismo em miniatura contribui para tornar estes laços mais fracos.
Quais são os modos de fazer isto? Governos não produzem cultura. Podem, ao máximo promover uma homogeneização cultural (v. GUIBERNAU, MONSERRAT, Nacionalismos.). É exemplo disso a escolha do Império Austro-Húngaro pela germanização em detrimento do seu multiculturalismo germânico-magiar.
Esta homogeneização é exemplo de nacionalismo oficial, e não popular. O “benchmark” que temos de nacionalismo oficial em escala reduzida é Reunião. Nela, Cláudio de Castro, utilizando-se das tradições de 10 anos de micronacionalismo define o que é o “way of life” reunião e o que está fora dele. Esta lógica foi aplicada por diversos governos na história, em especial nos absolutos/ditatoriais (vide Sião e Estados da Indochina), mas também nos democráticos (vide o massacre dos nativos da América do Norte pelos Estados Unidos) – desde que, nestes últimos, haja significativa distância entre o grupo dominante e a massa popular.O nacionalismo popular, entretanto, é de muito mais difícil realização – em especial no modo em que se dá o micronacionalismo atual. Para que este aconteça é necessário que a própria sociedade alimente o espírito de pertencimento e identidade nacionais, para que o vínculo de nacionalidade seja muito mais que uma escolha ordinária entre camisetas amarelas ou vermelhas, se tornando algo profundo – cujo rompimento não seja simples. Das relações sociais entre os indivíduos emergirá a idéia de nação e, naturalmente, a força do vínculo nacional será diretamente proporcional ao direcionamento das relações sociais ao reforço do sentimento nacional.
Afora isso, para que os micronacionalistas consigam compreender melhor as relações sociais, são necessárias novas ferramentas de comunicação. Muito embora a comunicação escrita tradicional do micronacionalismo transmita relações sociais, é fato que estas não se limitam a isso. As cores, imagens, cheiros, sons, movimentos e emoções formam aspectos intangíveis das relações sociais. Em outra palavras, é muito mais fácil perceber alguém você conversa por vídeo-conferência como um indivíduo real que tem relações sociais com você do que um remetente de e-mails que você não conhece.
Esta é a segunda revolução necessária: a tecnológica. Ela vive em função da primeira, tendo como objetivo reforçar a interpretação teleológica do projeto micronacional como sendo um projeto real de nação. As novas tecnologias ora disponíveis para utilização online têm como um ponto: a interatividade. E é na interação que reside o ponto nevrálgico das relações sociais. Sem aquela estas não podem existir.
Redes de relacionamento, wikis, vídeos, podcasts/blogs, fotos, áudio e vídeo-conferências. O desafio é conseguir agrupar todos estes elementos em um único recinto e trazer racionalidade em seus usos para o micronacionalismo. Tendo estes elementos como foco, deslocaremos o eixo da interação micronacional da emulação às relações político-sociais.
No lugar de palácios imaginários, fotos de nosso dia-a-dia pessoal. Ao invés de dizer “o que Hitler fez não importa no micronacionalismo”, o aproveitamento de toda a nossa carga intelectual e emocional em nossa prática micronacional. Podem pensar: ora, mas as pessoas terão “medo” de fazê-lo, de se expor. Ora, mas as mesmas já não o fazem hoje? Orkut, Flickr, Blogger, Skype, YouTube estão aí para nos provar isso. A tal “web 2.0”. Se as micronações passarem a se apresentar desta forma desde sua gênee, os novatos não terão problema em se adaptar – pois não estarão submersos nos velhos dogmas que habitam a Lusofonia.

Artigo

Definindo a idéia de nação – Peter Ravn Rasmussen (tradução: Carlos Góes).

Os seres humanos são animais tribais, com a tendência de se organizar em pequenos grupos em torno de machos e fêmeas dominantes – como um grupo de macacos em árvores. O elemento fundamental da organização humana é um grupo tribal e local, que, em sociedades mais avançadas, formam a base de uma estrutura mais elaborada de sociedade civilizada.

A idéia de nação (da palavra latina natio, que deriva de natus “nascido”) implica em um relacionamento comum de sangue. De fato, este relacionamento raramente é factual – mais comumente, deriva de um suposto ancestral comum. Este ancestral comum pode ser uma figura histórica, ou, na maioria das vezes, um ser mítico.

Colocando o tribalismo à parte, os laços que unem um grupo de pessoas em uma nação são muito mais complexos que simples relacionamentos sangüíneos (reais ou imaginários). Este relacionamento somente pode subsistir nos mais baixos níveis de organização social (e mesmo assim, hierarquias locais organizadas por sangue se tornaram raras no mundo moderno). À medida que a sociedade civilizada cresce, cada vez mais complexa, a nacionalidade se cria em função de uma série de fatores – sendo a ancestralidade comum somente um deles.

A linguagem é um fator, sem dúvida alguma – embora existam nações que existam com múltiplas línguas (obviamente, para cada história de sucesso, há um contra-exemplo de desintegração nacional por elementos lingüísticos). Entretanto, as nações com uma única linguagem dominante usualmente utilizam-se desta língua definir que eles são. Este é particularmente o caso daquelas situações em que a língua é extremamente difícil para que estrangeiros aprendam (e.g. dinamarquês, finlandês ou japonês).

A cultura e os artefatos da cultura, são importantes para a definição da nação – pergunte aos gregos sobre a importância dos Mármores de Elgin ou a um dinamarquês sobre os Chifres de Ouro. Usualmente, os artefatos culturais que mudaram de mãos ao longo da história se tornam objeto de disputa nacional, ícones de falta de afeição entre as nações envolvidas.

Os proponentes de uma ideologia nacionalista usualmente lançam mão da idéia de que sua nação é imutável e “original” – que as doutrinas e atributos de sua nação são fixos, e foram parte da característica nacional desde antes da invenção da escrita. Por exemplo, os nacionalistas alemães recordam a vitória sobre as legiões romanas nas Florestas de Teutoburgo, pelo líder tribal germânico Arminius (“Hermann”).

Não obstante, há claras evidências que nenhuma nação são entidades imutáveis. Paradoxalmente, se existe uma constância na sociedade humana, é sua transformação, e isso assegura que uma nação de hoje seja completamente diferente da nação de mesmo nome que existiu há uma geração. As nações estão evoluindo e modificando-se, tudo ao mesmo tempo.

Em resumo, alguns dos atributos da existência nacional [nationhood]:

  • Uma postulação comum de interrelacionamento – um laço “sangüíneo” entre os membros. Este relacionamento pode ser real, mas mais comumente, deriva de um mito;

  • Uma herança cultural comum. Esta herança, e particularmente os artefatos culturais (e também, por vezes, estruturas institucionais) que esta herança gerou, representam o “patrimônio” da nação, que é usualmente dotado de um considerável valor sentimental, à extenção de que ataques ao mesmo são respondidos com uma violência emocional;

  • Coerência lingüística, na forma de uma ou mais línguas identificadas com a identidade nacional. Quão mais únicas e difíceis forem estas línguais, mais forte será o vínculo emocional a elas, como algo que deve ser defendido. Em um mundo de telecomunicações de massa e de onipresença do inglês como língua franca, esforços estão sendo levados a cabo em todos mundo para proteger as línguas nacionais (mais claramente, na Islândia e na França);

  • Um sentimento de identidade, pelos membros, com a nação. A idéia de pertencimento nacional está claramente fundado na psiqué humana, e os membros de uma nação respondem de forma visceral a qualquer ameaça a mesma, seja esta real ou uma simples percepção.

Observando a lista acima, um leitor astuto verá que de forma alguma, ela é exaustiva – como não contém todos os atributos requeridos à existência nacional. Particularmente, um elemento ausente está inexoravelmente ligado à ideologia nacionalista: o território.

O território – sustento – não é uma algo conexo à nacionalidade, embora nos últimos século e, particularmente, desde a década de 1860, ele tenha se tornado encrustrado à base ideológica de muitas causas nacionalistas. A idéia de “terra natal”, este domínio quase mítico que é herança inalienável da nação é um conceito tão antigo quanto o Velho Testamento. Somente depois de Bismarck, entretanto, as aspirações territoriais de uma nação se tornaram tão importantes quanto são hoje.

Isso nos leva ao mais problemático de todos os conceitos: o de Estado-Nação. Os movimentos nacionalistas do Século XIX e posteriores criaram (ou, ao menos, evoluíram) este conceito, ligando a nação à terra. Esta percepção de inseparabilidade entre “Blut und Boden” (Sangue e Solo) causou várias guerras, nas quais duas nações reclamavam o mesmo território – e ambas reservavam seus “direitos” à terra com uma devoção quase divina.

O Estado-Nação, portanto, encorpa a idéia nacionalista de que deveria existir uma completa correspondência entre as nações e os Estados que as governam. Os tchecos deveriam ter uma terra tcheca, com um estado tcheco soberano a governando, -ai.

Este seria um princípio importante, se não fosse contrário aos fatos – o fatos sendo que existem pelo menos 8000 nacionalidades (factuais ou potenciais) na face da Terra, e que suas terras-natais reivindicadas frequentemente se sobrepõem. De modo similar, o ideal nacionalista de um mundo de Estados-Nação é impraticável, e potencialmente uma base para crueldade, perseguição, genocídio e limpesa étnica.

Ademais, o ideal nacionalista do Estado como a encarnação de uma única nação é irrelevante para exemplificar a natureza do Estado, que tentarei demonstrar no próximo capítulo.

Expediente

Editor – Carlos Góes

Redação – Carlos Góes, Filipe Sales, Rodrigo Mariano e Fernando Henrique Cardozo.

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Editorial

O reinado do polemicismo

Cheguei há pouco tempo a uma crítica conclusão – o fiz após completar o ciclo entre as três grandes: Reunião, Pasárgada e Porto Claro. Hoje a Lusofonia é dependente de polêmica para gerar atividade social nas micronações. Todas as três passam por período de baixa atividade, que se anima eventualmente por advento de uma crise ou polêmica. As experiências que passei recentemente – o socioculturalismo em Reunião e meu pedido de cidadania em Pasárgada – demonstram exatamente essa tendência.

Em Reunião, o caso é bem evidente. Após um ápice de misto de atividade mensagística e social causada exatamente por posições polêmicas tomadas por determinado grupo – do qual, no caso, eu fazia parte -, o país hoje jaz em um poço de inatividade, com mensagens sugerindo que todos “saiam pelados pelas ruas” para animar a nação. Essa situação era previsível e fora anunciada tanto por mim quanto pelo Filipe Sales. À época, foi considerada como uma postura arrogante de nossa parte.

A previsibilidade do fim da atividade se dava por uma análise empírica de qualquer radicalismo ou fundamentalismo. Os grupos radicais precisam de seu opositor para terem razão de existência. É por isso que, em última análise, Bush não quer o fim do terrorismo, Bin Laden não quer o fim do grande satã e o MST não quer a reforma agrária. Se a reforma agrária for de fato concretizada, qual seria a função prática da existência do MST? E assim se repetiu: uma vez acabando com o opositor, o acusador perde razão de ser. Assim, a efêmera atividade se diluiu.

O polemicismo sempre vai existir no micronacionalismo, e o mesmo não é, por si só, ruim. O erro está em emanar do polemicismo a principal fonte de atividade de uma micronação. Isto, pois o polemicismo gera uma atividade de curtíssima duração, que não está ligado a projeto algum: nem de poder, nem de pano de fundo ideológico.

Ademais, o polemicismo é faca de dois gumes. Se, por uma parte, pode servir para tirar uma nação da inatividade, por fazer com que micronacionalistas de qualidade percam a pequena motivação que ainda mantinham. Este modelo é insustentável. Meninos de 14 anos têm animação para levar brigas pequenas até longe. Jovens adultos, não. A nós, que hoje nos encaixamos neste último grupo, brigar pela briga em si mesma é nonsense.

Se não há micronacionalismo sem polêmica, o micronacionalismo não pode, certamente, SER polêmica.

 

Artigo

Crítica ao micronacionalismo lusófono. – McMillan Hunt, Dezembro de 2004.

Para qualquer da Comunidade Micronacional Lusófona,
Cuja mente possa tudo ler:

Neste período em que encontro-me, em que a ilusâo com o micronacionalismo pode ter sido, estar sendo ou vir a ser em seu ápice, consigo ver-me numa posiçâo um pouco peculiar acerca daqueles micronacionalistas que geralmente me cercam, em meu país e na comunidade em que o mesmo está inserido.

A primeira das coisas, motivo apenas inicial para nossa incrível distância é que a maioria dos mesmos parece estar viciada, fanática por simplesmente mandar mensagens de e-mail e posteriormente calcular, somar, gabar e envaidar-se e alimenta-se com seus números. Participar da Lista Nacional de Mensagens Eletrônicas é apenas uma fagulha do que um micronacionalista pode fazer, produzir ou apreender.

Isto pois, ao contrário do que certas ciências micronacionais possam estar vindo a deduzir nos últimos tempos [ lusofonia ] Nosso Território nâo localiza-se nos diretórios de informaçôes eletrônicas [pois estaria fragmentado em milhares de espaços (como HD´s dos cidadãos, dos servidores de internet, dos filtros eletrônicos, em chips de câmeras, em fitas e filmes de câmera, etc) e a micronaçâo, óbviamente, de modo algum significa ou manifesta fragmentação, ao contrário, existe somente enquanto uma certa forma de união muito intensa e SENTIMENTAL entre seus integrantes ] , a micronaçâo existe de modo tão real quanto nossa vida [a começar pelo fato de que somos NÓS CONSCIENTES que realizamos as coisas para o micronacionalismo, partindo do verdadeiro e único potencial que cada qual carrega em si ] e de modo algum pode estar calcada NO ELETRÔNICO, mesmo sendo uma micronaçâo-virtual*.

É necessário ver que bytes nada dizem, nada são por si só. Quando estamos numa micronaçâo? A lusofonia começou e viciar-se em criar bens eletrônicos para manifestar-se. Não posso mais esconder que, a grosso modo, faço um coro de Pedro Aguiar, e digo que as micronaçôes-virtuais estão em ou são um Reino Platônico.

* deve ver-se que mesmo este termo tem uma acepção diferente dos próprios significados semânticos que poderiam originar-se do estudo ou consulta da pura gramática brasileira, que caracteriza o adjetivo da seguinte maneira: “adj. m. e f. 1. Existente como potência ou faculdade, porém sem efeito atual. 2. Suscetível de se realizar; potencial. 3. Diz-se de imagem que tem seus pontos nos prolongamentos dos raios luminosos de um foco. = DIC Prático Michaelis” que muito difere da concepção originada mediante apresentaçâo do termo para os micronacionalistas. Trato de micronação-virtual como aquela micronação que não existe de modo físico-material em sua unidade (embora possa manifestar-se neste plano por meio de cartas, mensagens eletrônicas, papéis, desenhos e etc). De certo modo a micronação-virtual existe materialmente, mas somente como fagulhas solitárias DO MICRONACIONALISMO, pois o fenômeno material-micronacional é um grande e complexo derivado de uma existência imaginária. [tratarei em muitos caso de \micronação-virtual\ simplesmente como \micronação\ ]

Seriamos descaradamente ingênuos caso nâo partíssemos para considerar o consenso imaginário que uma micronação gera. Creio que o território que devemos explorar para as pesquisas micronacionais deve agora ser este, as formas de Imaginação e Memória que uma micronação forma.

Assim, sem uma possibilidade de conexão assídua ou paciente à Internet acabo realizando um distanciamento compulsório-voluntário ante a Comunidade que co-habito. Mas ao mesmo tempo que minha participação em Lista é morna creio estar produzindo micronacionalmente como em poucos momentos de minha vida.

Meus caros, já pensaram que uma vida micronacional é uma vida real? Não é a vida real que gastamos para dedicar-nos ao micronacionalismo? O quê e como iremos produzir para nossa construção humana é uma questão que todos deveríamos resolver.

No meu caso tenho pouquíssima paciência para dedicar minhas madrugadas ou tardes a ficar postando mensagens em uma lista enquanto as mesmas só deveriam aparecer quando um pensamento de ato interessante e relevante ocorresse e a minha mente não é um poço transbordante de inspiração.

Creio que os micronacionalistas poderiam dedicar-se em algo diferente, ao menos em seu computador, do que ficarem pendurados à Internet criando bugigangas de bytes. Se é um jornalista fique pendurado ao Front-Page a nos arquivos virtuais, se é um escritor gaste seu tempo no Word, se é construtor no Dreamweaver, artista gráfico no Corel, etc. O trabalho deve ser uma constante quando ocorre um ato para o micronacionalismo. O ócio não pode tomar lugar também na atuação dos seres no micronacionalismo, deve ser um espaço de realização para mentes interessadas em realmente produzir a aprender com o uso de sua imaginação, poder intelectual e mental.

Qual o problema de especializar-nos em nossas atividades micronacionais? Tudo o que devemos fazer é isto, desenvolver nossas aptidões e potenciais interiores. Vamos produzir material micronacional fruto de um trabalho intelectual-humano de fato, Arte de verdade, História de fatos, Cultura verdadeira. O micronacionalismo deve ser marcado por palco de atuação para a vida de grandiosos homens e de seus magníficos e imaginativos trabalhos paralelos enquanto \realidade\ mas frutos verdadeiros das aptidões mentais humanas!

A formação de \profissões micronacionais\ é um passo que devemos dar, irremediavelmente. A Lusofonia é um tipo muitíssimo peculiar de MICRONACIONALISMO e já está mais do que na hora de consolidar-se \ciências micronacionais\ , por exemplo.

Quero, secundariamente, citar que esta distância dá-se pois estamos longes em termos de realidade. Embora sejamos ambos participantes do MICRONACIONALISMO parece que isto significa e projeta-nos mundos e planos diferentes. Embora a mais íntima concepção disto seja realmente pessoal, individual e única é notável que exista grossos blocos padronizados dela, formadores da REALIDADE MICRONACIONAL. E é neste jogo de blocos de padrões de interpretação do MICRONACIONALISMO que sinto-me um tanto em separado da maioria dos que posso ver.

No meu ver os micronacionalistas estão encarando o micronacionalismo de modo pejorativo e assim praticando-o de modo falso, desleixado, fraco e ocioso. O que mesmo antigamente tinha o também pejorativo termo de \hobby\ [ pois é muito mais do que isso simplesmente ] agora adota uma acepção ainda pior, de uma brincadeira ou jogo eletrônico.

Custa-se a notar que praticar o MICRONACIONALISMO é muito mais do que \simular\ um país que não existe. No mínimo é a criação e sustentação de um plano imaginário coletivo para viver-se. A criação material de manifestações micronacionais [ seja eletrônica ou não ] é uma ferramenta de facilitação do transporte da consciência para este plano mediante identificação de símbolos [por isso geralmente já conhecidos ] a fim de virarem sinais, sentimentos. Muitas vezes isto funciona como um processo inconsciente porém voluntário por parte dos micronacionalistas.

Nossa realidade passa a estar calcada muito mais em tendências viciosas micronacionais do que em virtudes humanas. Isto gera uma própria banalização do ideário micronacional, que também passa a tornar-se menos virtuoso, e assim, do mesmo modo menos construtor para o ser. A Comunidade é mais alvo de investidas de fantasias tendênciosas da pessoalidade ou da própria inércia da ignorância de má-vontade do que de atividades criativas e dedicadas sem ânsia de mérito.

Não estamos em nossa micronação somente quando sentamos na frente do computador ou navegamos em suas web-páginas. Estamos no MICRONACIONALISMO quando sentimos isto, quando simplesmente imaginamos realmente estar praticando outra vida em um lugar diferente sob leis e regras de funcionamento também distintas das que estamos ordinariamente acostumados a vivenciar [ no MACRONACIONALISMO ] .

Praticar o micronacionalismo não é simplesmente \deixar a vida pra lá\ ou \praticar o ócio\ mas sim deslocar o local de sua vivência integralmente. A VIDA é a mesma, o micronacionalista escolhe se irá praticá-la em sua macro ou micro nação.

Falta-nos direcionar nossa dedicação mental, o emprego de nossos potenciais em nossas atividades, a interpretação verdadeira de nossas aspirações, o desenvolver de nossos poderes e o realizar de nossos interesses.

Eu vejo nos dias de hoje pessoas praticando o micronacionalismo que elogiei aqui, são poucos e estão espalhados pelo micromundo. Estes já são os pioneiros na criação e estudo do conhecimento e implementação da ciência e sabedoria voltadas integral e genuinamente ao micronacionalismo, na vontade de dar a plenitude das capacidades humanas que possam no mesmo ser empregadas.

Embora este movimento possa ser uma própria tendência oriunda da evolução micronacional não são os caminhos observados, nos dias de hoje, pelos micronacionalistas. É na vista disto que é necessário a Comunidade saber que estamos andando a passos de tartaruga ou a direções de auto-destruição.

Aliada aos micronacionalistas persistentes e escassos que hoje ainda existem [ de mais de 3 anos ] e que detém grande parte de poder do potencial desta mudança existe uma grande fatia de micronacionalistas muito jovens e de força-de-vontade que em suas vidas micronacionais apenas aguardam um direcionamento que sirva de base para desenvolvê-las. É nisto também que existe a extrema necessidade de aniquilar-se escolas de falso micronacionalismo, que doutrinam de forma alienante e errada os primeiros passos dos que chegam.

Assim, é visto que o potencial da mudança reside primeiramente nos antigos micronacionalistas [ que tiveram oportunidade de testemunhar e participar dos últimos processos evolucionários ocorridos na Comunidade ] e , a posteriori, numa harmonização e transmissão de seus conhecimentos e sabedorias para mentes novas e intocadas por tipos viciosos, ociosos e alienantes do micronacionalismo. É notável que o colégio dominante e opressor é o de uma fraca e inconsistente prática e a ele estão fadados a fazer parte todos os novos micronacionalistas que não tenham o rumo de suas vidas tocado e assim transmutado pelos praticantes do verdadeiro micronacionalismo.

Que os seguidores deste possam deixar de ser poucos e conhecidos, que a Comunidade como um todo acorde para um novo modo de realizar a prática micronacional [ que na verdade é o mais genuíno deles e que está por quase todo esquecido ], realmente construtor e influente na formação humana, e que deste modo entremos todos, como um só corpo mental, numa nova fase para o desenvolvimento da própria.

Que indivíduos cientes e voluntariosos venham a trabalhar na reconstrução do IDEAL MICRONACIONAL , mediante todos os atos que possam premeditar e\ou conscientizar , para encaminhá-lo para a direção de uma rota evolutiva. Pois os últimos acontecimentos na Comunidade têm mostrado que uma evolução-micronacional não é um movimento de todo ou perceptivelmente voluntariosamente natural. É visto que muito possivelmente tenhamos acabado de vivenciar ou mesmo estar vivenciando um significativo declínio na qualidade das vidas e sua produções micronacionais.

É numa preocupação de que esta última tendência torne-se completa e forçosamente incontrolável ou irremediável e que afunde o micronacionalismo para viver sob ossos e pedras ou até acabar-se como se conhece ou conheceu-se que escreve-se esta Crítica.

O micronacionalismo não é um hobby, é a vida.

Expediente

Editor – Carlos Góes

Redação – Carlos Góes, Filipe Sales, Rodrigo Mariano e Fernando Henrique Cardozo.


O micronacionalismo contemporâneo necessita de duas revoluções: uma teleológica e outra tecnológica.
A primeira, passa pela construção de um verdadeiro nacionalismo popular – ex partis populis – que, por meio da lenta lapidação de uma cultura comum – com doutrinas, normas de procedimento, artefatos, símbolos, métodos e costumes -, gere os laços imaginários de identidade nacional que faltam para dar razão ao fragmento -nacionalismo do [micro-]nacionalismo. Este é processo extremamente complexo, pois a construção de vínculos nacionais interpessoais leva algum tempo e, ademais, o aspecto voluntarista do nacionalismo em miniatura contribui para tornar estes laços mais fracos.
Quais são os modos de fazer isto? Governos não produzem cultura. Podem, ao máximo promover uma homogeneização cultural (v. GUIBERNAU, MONSERRAT, Nacionalismos.). É exemplo disso a escolha do Império Austro-Húngaro pela germanização em detrimento do seu multiculturalismo germânico-magiar.
Esta homogeneização é exemplo de nacionalismo oficial, e não popular. O “benchmark” que temos de nacionalismo oficial em escala reduzida é Reunião. Nela, Cláudio de Castro, utilizando-se das tradições de 10 anos de micronacionalismo define o que é o “way of life” reunião e o que está fora dele. Esta lógica foi aplicada por diversos governos na história, em especial nos absolutos/ditatoriais (vide Sião e Estados da Indochina), mas também nos democráticos (vide o massacre dos nativos da América do Norte pelos Estados Unidos) – desde que, nestes últimos, haja significativa distância entre o grupo dominante e a massa popular. O nacionalismo popular, entretanto, é de muito mais difícil realização – em especial no modo em que se dá o micronacionalismo atual. Para que este aconteça é necessário que a própria sociedade alimente o espírito de pertencimento e identidade nacionais, para que o vínculo de nacionalidade seja muito mais que uma escolha ordinária entre camisetas amarelas ou vermelhas, se tornando algo profundo – cujo rompimento não seja simples. Das relações sociais entre os indivíduos emergirá a idéia de nação e, naturalmente, a força do vínculo nacional será diretamente proporcional ao direcionamento das relações sociais ao reforço do sentimento nacional.
Afora isso, para que os micronacionalistas consigam compreender melhor as relações sociais, são necessárias novas ferramentas de comunicação. Muito embora a comunicação escrita tradicional do micronacionalismo transmita relações sociais, é fato que estas não se limitam a isso. As cores, imagens, cheiros, sons, movimentos e emoções formam aspectos intangíveis das relações sociais. Em outra palavras, é muito mais fácil perceber alguém você conversa por vídeo-conferência como um indivíduo real que tem relações sociais com você do que um remetente de e-mails que você não conhece.
Esta é a segunda revolução necessária: a tecnológica. Ela vive em função da primeira, tendo como objetivo reforçar a interpretação teleológica do projeto micronacional como sendo um projeto real de nação. As novas tecnologias ora disponíveis para utilização online têm como um ponto: a interatividade. E é na interação que reside o ponto nevrálgico das relações sociais. Sem aquela estas não podem existir.
Redes de relacionamento, wikis, vídeos, podcasts/blogs, fotos, áudio e vídeo-conferências. O desafio é conseguir agrupar todos estes elementos em um único recinto e trazer racionalidade em seus usos para o micronacionalismo. Tendo estes elementos como foco, deslocaremos o eixo da interação micronacional da emulação às relações político-sociais.
No lugar de palácios imaginários, fotos de nosso dia-a-dia pessoal. Ao invés de dizer “o que Hitler fez não importa no micronacionalismo”, o aproveitamento de toda a nossa carga intelectual e emocional em nossa prática micronacional. Podem pensar: ora, mas as pessoas terão “medo” de fazê-lo, de se expor. Ora, mas as mesmas já não o fazem hoje? Orkut, Flickr, Blogger, Skype, YouTube estão aí para nos provar isso. A tal “web 2.0”. Se as micronações passarem a se apresentar desta forma desde sua gênese, os novatos não terão problema em se adaptar – pois não estarão submersos nos velhos dogmas que habitam a Lusofonia.

Editorial

John Stuart Mill e um discurso pela pluralidade.
Pois a maioria dos homens eminentes de todas as gerações passadas tinham muitas opiniões que agora se sabem erradas, e aprovaram várias coisas que hoje ninguém justificaria. […] O homem, como ser moral ou político, […] pode corrigir seus mal-feitos. Ele é capaz de retificar-se de seus erros, pelo debate e pela experiência. Não somente pela experiência. É necessária a discussão. […] No caso de uma pessoa cujo julgamento realmente merece confiança, o que o faz como tal? Pois ele manteve uma mente aberta para as críticas em relação a suas opiniões e condutas. Pois ele manteve a prática de ouvir tudo o que podia ser dito contra si, considerar o que é justo e descartar o que é falacioso. (John Stuart Mill. On Liberty. p. II.7. original em: http://www.econlib.org/library/Mill/mlLbty.html).

Sem concorrência não há incentivo à inovação: esta talvez é uma das afirmações mais corretas de utilitaristas como JS Mill. Quando não há pluralidade de opiniões não pode se falar em liberdade, pois não há direito de escolha. Não existindo voz dissonante, é impossível que haja debate. Sem debate, não há como corrigir erros do passado. O debate faz com que as teses, ainda que opostas, amadureçam e ganhem consistência interna.

É por isso que o objetivo pessoal do político em aniquilar sua oposição distoa tanto de seu dever oficial quando mandatário público. Se parece bom ao político que sua visão de mundo seja a única, para sociedade, isto é o desastre: é a estagnação de sua evolução, ou mesmo um retrocesso.

Aqueles que hoje ocupam cargos de poder nas três principais nações lusófonas: Reunião, Porto Claro e Pasárgada precisam se atentar a isso. Não seria o pensamento único e a ditadura da maioria a possível causa do marasmo político-social do micronacionalismo em língua portuguesa?

Pessoalmente, a despeito de ter firme minhas visões de mundo e convicções políticas, nunca fugi do debate. Ao contrário, sempre ouvi meus opositores diretos. Isso não significa, todavia, que a disposição de ouvir significa necessariamente concordar com o que é colocado. Nos dizeres de Mill: “considerar o que é justo, descartar o que é falacioso”. Ademais, já falei algumas vezes da necessidade de se manter os velhos paradigmas dentro do debate micronacional, como contraponto ao que proponho.

Por uma lusofonia plural e aberta ao debate.

 

Pensamento socioculturalista

As duas revoluções – Carlos Góes.
O micronacionalismo contemporâneo necessita de duas revoluções: uma teleológica e outra tecnológica.
A primeira, passa pela construção de um verdadeiro nacionalismo popular – ex partis populis – que, por meio da lenta lapidação de uma cultura comum –  com doutrinas, normas de procedimento, artefatos, símbolos, métodos e costumes -, gere os laços imaginários de identidade nacional que faltam para dar razão ao fragmento -nacionalismo do [micro-]nacionalismo. Este é processo extremamente complexo, pois a construção de vínculos nacionais interpessoais leva algum tempo e, ademais, o aspecto voluntarista do nacionalismo em miniatura contribui para tornar estes laços mais fracos.
Quais são os modos de fazer isto? Governos não produzem cultura. Podem, ao máximo promover uma homogeneização cultural (v. GUIBERNAU, MONSERRAT, Nacionalismos.). É exemplo disso a escolha do Império Austro-Húngaro pela germanização em detrimento do seu multiculturalismo germânico-magiar.
Esta homogeneização é exemplo de nacionalismo oficial, e não popular. O “benchmark” que temos de nacionalismo oficial em escala reduzida é Reunião. Nela, Cláudio de Castro, utilizando-se das tradições de 10 anos de micronacionalismo define o que é o “way of life” reunião e o que está fora dele. Esta lógica foi aplicada por diversos governos na história, em especial nos absolutos/ditatoriais (vide Sião e Estados da Indochina), mas também nos democráticos (vide o massacre dos nativos da América do Norte pelos Estados Unidos) – desde que, nestes últimos, haja significativa distância entre o grupo dominante e a massa popular.

O nacionalismo popular, entretanto, é de muito mais difícil realização – em especial no modo em que se dá o micronacionalismo atual. Para que este aconteça é necessário que a própria sociedade alimente o espírito de pertencimento e identidade nacionais, para que o vínculo de nacionalidade seja muito mais que uma escolha ordinária entre camisetas amarelas ou vermelhas, se tornando algo profundo – cujo rompimento não seja simples. Das relações sociais entre os indivíduos emergirá a idéia de nação e, naturalmente, a força do vínculo nacional será diretamente proporcional ao direcionamento das relações sociais ao reforço do sentimento nacional.

Afora isso, para que os micronacionalistas consigam compreender melhor as relações sociais, são necessárias novas ferramentas de comunicação. Muito embora a comunicação escrita tradicional do micronacionalismo transmita relações sociais, é fato que estas não se limitam a isso. As cores, imagens, cheiros, sons, movimentos e emoções formam aspectos intangíveis das relações sociais. Em outra palavras, é muito mais fácil perceber alguém você conversa por vídeo-conferência como um indivíduo real que tem relações sociais com você do que um remetente de e-mails que você não conhece.
Esta é a segunda revolução necessária: a tecnológica. Ela vive em função da primeira, tendo como objetivo reforçar a interpretação teleológica do projeto micronacional como sendo um projeto real de nação. As novas tecnologias ora disponíveis para utilização online têm como um ponto: a interatividade. E é na interação que reside o ponto nevrálgico das relações sociais. Sem aquela estas não podem existir.
Redes de relacionamento, wikis, vídeos, podcasts/blogs, fotos, áudio e vídeo-conferências. O desafio é conseguir agrupar todos estes elementos em um único recinto e trazer racionalidade em seus usos para o micronacionalismo. Tendo estes elementos como foco, deslocaremos o eixo da interação micronacional da emulação às relações político-sociais.
No lugar de palácios imaginários, fotos de nosso dia-a-dia pessoal. Ao invés de dizer “o que Hitler fez não importa no micronacionalismo”, o aproveitamento de toda a nossa carga intelectual e emocional em nossa prática micronacional. Podem pensar: ora, mas as pessoas terão “medo” de fazê-lo, de se expor. Ora, mas as mesmas já não o fazem hoje? Orkut, Flickr, Blogger, Skype, YouTube estão aí para nos provar isso. A tal “web 2.0”. Se as micronações passarem a se apresentar desta forma desde sua gênee, os novatos não terão problema em se adaptar – pois não estarão submersos nos velhos dogmas que habitam a Lusofonia.

Artigo

Micronacionalismo e vida – Bruno Cava, Março-Maio de 2005.

PARTE I

O título deste artigo contém duas coisas que são freqüentemente separadas e, às vezes, até contrapostas. O cisalhamento de micronacionalismo e vida se revela em várias expressões e discursos dos micronacionalistas. É uma antinomia universalmente conhecida não apenas na casca de noz lusófona, mas em todo mundico. Aparece, principalmente, por meio da dicotomia “micro” x “macro”, que num sentido ampliado passou a significar – inconscientemente ou não – duas realidades existenciais distintas: a vida micronacional e a “vida real”, a propriamente dita, a que “realmente” importa, a “verdade verdadeira”.

Outro exemplo expressivo está na definição de micronacionalismo como um mundo à parte, novamente num sentido amplíssimo, em que o micro se diferencia do “mundo real”, o universo em que vivemos “efetivamente”. Versões alternativas e atenuadas desta visão acontecem quando diminuímos o fenômeno (afinal, ele é micro) a ponto de o reduzirmos a um mero hobby, jogo ou até terapia, em um sentido que claramente se contrapõe à “vida verdadeira”, de verdadeiras preocupações, problemas, objetivos e, porque não, de verdadeiras pessoas.

Nesta concepção, o micronacionalismo somente medra no momento em que o micronacionalista detém plena estabilidade econômica, profissional/acadêmica e emocional e somente quando sobrar algum tempinho “vago” (nenhum tempo é vago!), podendo, enfim, exercitar seu lado lúdico, terapêutico, num supremo desinteresse e numa pura inutilidade. Atividade absolutamente gratuita, desimportante, altamente secundária, auto-suficiente, estanque, um “fim em si mesmo” como se tornou cliché afirmar.

Satisfeito de si e profundamente irreal, o micronacionalismo resume-se a um mero deleite pessoal, ao abrigo do tumulto e das lutas da vida, refugiado do “real”, numa evasão da existência para um mundo melhor, vôo (mergulho?) da imaginação ao utópico, remédio diário às frustrações, disparates, injustiças, angústias e solidões, voluntário divórcio do micronacionalista perante as preocupações que afligem a humanidade e que, tão reais. Colocar a vida entre parênteses e fruir do hobby que chamamos micronacionalismo.

Mas há um outro lado, um outro micronacionalismo. É o micronacionalismo que se pretende empenhado, engagé, compenetrado, que quer enfrentar os problemas de seu tempo, que deseja difundir e discutir questões políticas, religiosas, sociais, culturais, científicas, que quer ver triunfar a potencialidade da vida, no e pelo micronacionalismo, o que, por via transversa, significa triunfar a potencialidade do micronacionalismo, no e pela vida. Micronacionalista assim é aquele que se atira ao mundo micronacional em busca do alimento espiritual pleno e lhe destaca um campo de ação tão vasto quanto o da vida.

Acompanhando a experiência do micronacionalista desde a adesão, mistura-se e confunde-se com as demais esferas de sua vida, múltiplas esferas que se concertam, como numa canção, à unidade rítmica da própria vida. Tensão dialética do viver micronacionalmente e do micronacionalismo vivente, um contribuindo ao outro ou, melhor, um sobrepondo-se ao outro, num cadinho em que não se separam as mediações; elas tão-somente se distinguem, o que é bem diferente. O micronacionalismo em cada um é parte indissociável de sua história de vida, inextricável do seu estar-no-mundo.

Na verdade, procuramos expor acima dois aspectos que, na prática micronacional, são inseparáveis e essenciais. Em um vetor, o micronacionalismo enquanto manifestação da vida e potência de realização; no outro, a função lúdica, hobbística, contemplativa, o “micronacional pelo micronacional”, encerrado na torre de marfim dos virtualismos. Aqui, o espaço do jogo, do distanciamento, da fuga, dos pseudônimos; lá, a adesão plena, o mergulho existencial, o empenho, a responsabilidade, o nome verdadeiro.

Resolver a antinomia, conciliando os extremos, é a tarefa que nos impusemos para a próxima versão da Avant-Garde.

PARTE II

Como é possível que uma mesma atividade possa se manifestar de maneiras tão diametralmente opostas? Como podem alguns micronacionalistas acreditarem no cisalhamento da realidade, no micronacionalismo da evasão, do hobby e do jogo, enquanto outros vinculam-se à tendência exatamente contraposta: adesão, engajamento, compromisso sério e realismo?

Por um lado, o micronacionalismo está realmente ligado à vida. Somos nós mesmos enquanto micronacionalistas. Por mais que se assuma deliberadamente uma postura escapista, transformando-se em um personagem, um alter ego, não se pode escapar por completo da existência pessoal. Por detrás da máscara, o ser real, uma história única de vida, em sua especificidade e complexidade. Todo esforço por se despir de si-mesmo é, em última instância, vão e ilusório, vindo a personalidade verdadeira, real e autêntica a emergir, tanto mais quanto mais intenso – vívivo – o momento.

Os paplistas mais experientes e ardilosos jamais conseguirão produzir um outro “eu”, na medida em que este Outro não passa da composição consciente a partir da vida espiritual do paplista, uma dilatação e contração do próprio ser segundo os mesmos caracteres. Somente alguém que sofra de genuína múltipla-personalidade – distúrbio estudado pela psiquiatria – seria capaz de se travestir plenamente em dois ou mais personagens. Ainda assim, conseguiria fazê-lo somente inadvertidamente; isto é, ora participará como um e ora como outro, mas sem sabê-lo, podendo ocorrer de as personalidades interagirem entre si à revelia da consciência do indivíduo perturbado.

Na dramaturgia, quando um ator interpreta Hamlet, ele não está “incorporando” a personagem shakespereana enquanto tornando-se a personagem. Na verdade, ele próprio está criando e construindo o príncipe dinamarquês. E está construindo-o a partir de sua experiência, de sua história; vê a personagem através da própria vida e é incapaz de interpretá-lo longe dessa amálgama existencial. A personagem, portanto, é tão-somente um referencial estilístico, um recipiente que o intérprete irá preencher com o seu próprio ser; o ator é o escultor que dá forma à matéria bruta; uma peça de Shakespeare seria um diamante em estado bruto e não passará disto antes que alguém suficientemente talentoso dê-lhe a forma apropriada.

Portanto, nem mesmo nos casos extremos, se pode pensar em separar o mundo micronacional do “mundo real”, a fortiori, não se pode separar o “eu micronacionalista” do “eu real”, mesmo quando o indivíduo intencionalmente busca travestir-se em outrem, como nas micronações altamente virtualistas, nas peculiaristas e naquelas em que “controlar” múltiplos personagens é permitido. A teoria da dupla-verdade, a visada do simplório sobre o “micro” e “macro”, estudada mais a fundo, só pode resultar em esquizofrenia: irracional, ilógica, impensável.

De outro lado, o micronacionalismo é também uma atividade específica da vida, que dela aflora, afirmando-se em uma natureza particular, ou seja, um espaço com regras próprias, distinto, peculiar à vida. Quando se define o micronacionalismo como hobby ou jogo, atividade lúdica, quer-se frisar a especificação da prática micronacional perante outras práticas. A idéia é delinear com clareza a esfera de existência que é o mundo micronacional, ressaltando-se que não é o mesmo que a esfera familiar, a esfera profissional, a acadêmica, a “social”, a amorosa e tantas outras, cada qual com suas regras próprias. Quando se coloca o micronacional à parte da “vida real”, do “macro”, a idéia é distingui-lo das outras muitas esferas.

Assentar a coesão entre micronacionalismo e vida não é o mesmo que declarar a fusão dos dois; não significa a desaparição do primeiro conceito no segundo. O problema reverso também deve ser evitado: afirmar a pura gratuidade e autonomia do micronacionalismo é esquecer-se do quanto este deve à vida e como pode influir nela. Quando se fala em micronacionalismo real ou engajado, destaca-se que a vida humana nele penetra e por ele é penetrada, podendo ser tão razão de vida quanto outras razões, a critério do indivíduo e exercendo funções gerais da vida: educação, moral, cultural, científica, religiosa, política etc.

Seriedade e jogo, compromisso e hobby, realismo e virtualismo, responsabilidade e evasão, funcionalidade e gratuidade encontram-se e cooperam entre si e nisto não há nada de enigmático. O vôo da imaginação, a alegria de ser Outro e o desapego irresponsável conciliam-se com o mergulho existencial, a angústia de ser Si-Mesmo e o laço de responsabilidade; compatibilizam-se necessariamente ou senão o mundo micronacional descarrilhar-se-ia para os dois extremos que o anulariam: 1) a esquizofrenia indizível e 2) o esvaziamento da natureza micronacional.

É preciso manter os dois aspectos juntos. Pois quando o mundo micronacional adquire sua caracterização, sua esfera particular, ele é invadido e alimentado pela vida, e é aí que ele ganha vida, que fica animado como vida micronacional que é. Na vida, o micronacionalismo encontra a sua humanidade; no micronacionalismo, a vida encontra essa forma de realização particular, diferenciada, que nos caracteriza. No fundo, trata-se da crônica dificuldade em diferenciar os verbos “distinguir” e “separar”.

O micronacionalismo não se separa da vida; o micronacionalismo distingue-se na vida.

Expediente

Editor – Carlos Góes

Redação – Carlos Góes, Filipe Sales, Rodrigo Mariano e Fernando Henrique Cardozo.


Editorial

Destino e futuro.
Existe destino?! Existe karma?! Como estou em uma fase John Locke (não o filósofo, mas o do Lost =]), tendo a dizer que as coisas acontecem “‘cause it was supposed to”. Coisas tristes aconteceram em minha vida ultimamente. Em sua face micronacional e nos outros aspectos também.

De repente é isso: karma. De repente preciso mesmo me dedicar a alguns outros projetos: acadêmicos, profissionais. Afinal, todos sabemos o quanto de nosso tempo que o exercício nacional em miniatura (e, no meu caso, as reflexões sobre o mesmo) gasta.

Neste curto editoral, regado a cerveja, introduzo artigo fresco.

 

Pensamento socioculturalista

O Quinto Mundo e o Novo Micronacionalismo – Carlos Góes.
Talvez uma dos grandes problemas da Lusofonia seja o fato dela ser praticamente um vaso hermeticamente fechado. Salvo em algumas inflexões nesta tendência – como os remotos avanços ruma à extra-lusofonia de Porto Claro, Reunião e, mais recentemente, na gênese de Pasárgada -, as micronações de língua portuguesa acabam por relacionarem-se basicamente entre si. Quais foram os reflexos disto?

Por uma parte, foi positivo o fato de ser criado um certo padrões de regras, normas, modos de procedimento que caracterizaram a Lusofonia como sociedade intermicronacional (ver GÓES & GARCIA, Relações Intermicronacionais: Conceitos. Maurício: FTS, 2006). Isso significa que as micronações que se aglutinam em volta do português não só passaram a agir como parte de um todo, mas a criar padrões de procedimento que denotam uma certa “unidade cultural”. Por outro lado, a inexistência de um contato mais profundo com modos de ver o micronacionalismo acabou por estagnar a corrente dominante. É fato que a existência de uma dialética que opõe teses ajuda o surgimento de uma conceituação mais refinada [tese x antítese = síntese = nova tese; nova tese x nova antítese = nova síntese].

Seria importante o contato com alguns modelos distintos de se ver a prática nacional em escala reduzida. Aquele que me chama muito a atenção é um que pouco foi explorado pelos micropatriólogos de lingua portuguesa: o Quinto Mundo. Um dos que se aventurou neste caminho foi Bruno Cava, que já citava, há alguns anos sobre o mesmo (ver CAVA, Micronacionalismo Lato Sensu. Maurício: FTS, 2006).

Do que consiste o Quinto Mundo. Em sua auto-definição, encontrada no “Portal do Quinto Mundo” (http://5world.net/), o Quinto Mundo consiste de “pequenas nações e minorias ao redor do mundo que não têm representação nas organizações internacionais como as Nações Unidas (ONU) ou a Organização das Nações e Povos Não-Representados (UNPO)”. Deste modo, o Quinto Mundo não vê suas nações associadas como distintas daquelas que têm reconhecimento pelas Nações Unidas, ou mesmo pela UNPO. Ao contrário, simplesmente entendem que a dinâmica de poder vigente no cenário internacional, dominado pelos chamados “Estados Nacionais”, não lhes garante reconhecimento.

Ademais, de acordo com um conceito jurídico gerado pelo Quinto Mundo, o Jus celebri electroni, o exercício nacional que se utiliza da web não está sobre jurisdição de qualquer Estado Nacional. Isto, pois “de acordo com o Artigo 1º da Convenção de Montevideo, um Estado só o é se tiver um território. Estados não territoriais ou virtuaisnão são verdadeiros Estados de acordo com esta Convenção. Já que os Estados não-territoriais não são Estados verdadeiros de acordo com o Direito Internacional […] computadores, servidores e redes de informática como a Internet não são jurisdição legal do Estado Nacional, inclusive seu poder de regulação e taxação” (ver http://jce.5world.net/).

Nesse sentido, vemos o exercício nacional como algo descolado do Estado Nacional em que seus membros se encontram. Isso se torna claro mesmo se analisarmos as nações que coincidem com Estados membros das Nações Unidas. Se existem portugueses que vivem no Brasil, no Reino Unido, na Bélgica e no Japão, não são eles, ainda assim, membros da nação portuguesa?

A mesma analogia pode ser feita com as micronações. Não importa estarem cidadãos pasárgados em Portugal, Estados Unidos e Brasil. A distância entre os membros da nação não importa para o exercício da nacionalidade, pois o conceito de nação, diferentemente do de Estado, não está ligado a um território.

Do mesmo modo, pouco importa se temos também a nacionalidade brasileira, peruana ou suíça. Nacionalidade é um conceito jurídico. À época do Império Austro-Húngaro, austríacos e magiares tinham o mesmo status jurídico, o mesmo passaporte e os mesmo direitos. Ainda assim, faziam parte de nações diferentes. Afora isso, o senso de pertencimento a várias nações pode ser verdadeiro. Não necessariamente um filho de italiano nascido no Brasil deixa de se sentir como parte da nação italiana. É por isso que podemos ser brasileiros e porto-clarenses, peruanos e pasárgados, portugueses e reuniãos.

Expediente

Editor – Carlos Góes

Redação – Carlos Góes, Filipe Sales, Rodrigo Mariano e Fernando Henrique Cardozo.


Talvez uma dos grandes problemas da Lusofonia seja o fato dela ser praticamente um vaso hermeticamente fechado. Salvo em algumas inflexões nesta tendência – como os remotos avanços ruma à extra-lusofonia de Porto Claro, Reunião e, mais recentemente, na gênese de Pasárgada -, as micronações de língua portuguesa acabam por relacionarem-se basicamente entre si. Quais foram os reflexos disto?

Por uma parte, foi positivo o fato de ser criado um certo padrões de regras, normas, modos de procedimento que caracterizaram a Lusofonia como sociedade intermicronacional (ver GÓES & GARCIA, Relações Intermicronacionais: Conceitos. Maurício: FTS, 2006). Isso significa que as micronações que se aglutinam em volta do português não só passaram a agir como parte de um todo, mas a criar padrões de procedimento que denotam uma certa “unidade cultural”. Por outro lado, a inexistência de um contato mais profundo com modos de ver o micronacionalismo acabou por estagnar a corrente dominante. É fato que a existência de uma dialética que opõe teses ajuda o surgimento de uma conceituação mais refinada [tese x antítese = síntese = nova tese; nova tese x nova antítese = nova síntese].

Seria importante o contato com alguns modelos distintos de se ver a prática nacional em escala reduzida. Aquele que me chama muito a atenção é um que pouco foi explorado pelos micropatriólogos de lingua portuguesa: o Quinto Mundo. Um dos que se aventurou neste caminho foi Bruno Cava, que já citava, há alguns anos sobre o mesmo (ver CAVA, Micronacionalismo Lato Sensu. Maurício: FTS, 2006).

Do que consiste o Quinto Mundo. Em sua auto-definição, encontrada no “Portal do Quinto Mundo” (http://5world.net/), o Quinto Mundo consiste de “pequenas nações e minorias ao redor do mundo que não têm representação nas organizações internacionais como as Nações Unidas (ONU) ou a Organização das Nações e Povos Não-Representados (UNPO)”. Deste modo, o Quinto Mundo não vê suas nações associadas como distintas daquelas que têm reconhecimento pelas Nações Unidas, ou mesmo pela UNPO. Ao contrário, simplesmente entendem que a dinâmica de poder vigente no cenário internacional, dominado pelos chamados “Estados Nacionais”, não lhes garante reconhecimento.

Ademais, de acordo com um conceito jurídico gerado pelo Quinto Mundo, o Jus celebri electroni, o exercício nacional que se utiliza da web não está sobre jurisdição de qualquer Estado Nacional. Isto, pois “de acordo com o Artigo 1º da Convenção de Montevideo, um Estado só o é se tiver um território. Estados não territoriais ou virtuaisnão são verdadeiros Estados de acordo com esta Convenção. Já que os Estados não-territoriais não são Estados verdadeiros de acordo com o Direito Internacional […] computadores, servidores e redes de informática como a Internet não são jurisdição legal do Estado Nacional, inclusive seu poder de regulação e taxação” (ver http://jce.5world.net/).

Nesse sentido, vemos o exercício nacional como algo descolado do Estado Nacional em que seus membros se encontram. Isso se torna claro mesmo se analisarmos as nações que coincidem com Estados membros das Nações Unidas. Se existem portugueses que vivem no Brasil, no Reino Unido, na Bélgica e no Japão, não são eles, ainda assim, membros da nação portuguesa?

A mesma analogia pode ser feita com as micronações. Não importa estarem cidadãos pasárgados em Portugal, Estados Unidos e Brasil. A distância entre os membros da nação não importa para o exercício da nacionalidade, pois o conceito de nação, diferentemente do de Estado, não está ligado a um território.

Do mesmo modo, pouco importa se temos também a nacionalidade brasileira, peruana ou suíça. Nacionalidade é um conceito jurídico. À época do Império Austro-Húngaro, austríacos e magiares tinham o mesmo status jurídico, o mesmo passaporte e os mesmo direitos. Ainda assim, faziam parte de nações diferentes. Afora isso, o senso de pertencimento a várias nações pode ser verdadeiro. Não necessariamente um filho de italiano nascido no Brasil deixa de se sentir como parte da nação italiana. É por isso que podemos ser brasileiros e porto-clarenses, peruanos e pasárgados, portugueses e reuniãos.


Editorial

A vantagem da democracia
Micronacionalismo para mim está intimamente relacionado a aprendizado, evolução. Durante dois anos, vivenciei a realidade de Reunião, que tem sua lógica peculiar. Naturalmente, o Imperador, por absoluto, acaba por fazer girar em torno de si toda a micronação. Como em todo Império o eixo de aglutinação é a Monarquia e não a identidade nacional abstrata. Como relatado pelo notável Carlos Fraga em entrevista à Rádio Reunião: “antes de tudo, meu partido é o Imperador”.

Nesse sentido, grande parte dos cidadãos de Reunião acabam por reclamar seus objetivos diretamente ao Imperador, ao invés de tentar seguir a lógica natural de respeito às competências dos Poderes ordinários: Judiciário, Legislativo e Executivo. Isso garante, certamente, grande estabilidade ao sistema reunião: é fato que o mesmo assegura a continuidade do projeto. Por outra parte, fica à mostra a política hobbeseana crua: o jogo de poder é evidente e público, e as regras são sempre dobradas para favorecer ao grupo que consegue fazer mais pressão sobre o Imperador.

Certamente, aprendi muito com isso, inclusive a ser precavido, ao invés de ter confiança em todos. Não consegui, todavia, ceder ao jogo de interesses clarividente em Reunião, à busca pura e simples por poder e posições políticas.

A Democracia, ora vivenciada por mim em Pasárgada, abre novas oportunidades. Abre a oportunidade de ver a vivência em um sistema em que não há “dono da bola”, onde os conflitos são administrados na esfera pública e as regras do jogo estão claras. Espero poder fazer aqui política – com bases ideológicas – e não politicagem. Quero lançar projeto de nação e não projeto de poder.

Pela recepção e os convites a ingressar às Casas que tive, isto será possível. Realmente espero que esteja eu certo.

 

Pensamento socioculturalista

Micronacionalismo do Século XXI – Carlos Góes.
Qual é o motivo do esvaziamento do micronacionalismo?!

As respostas para a pergunta supracitada podem ser variadas. Proponho uma que é ampla o bastante para abranger uma série de fatores e suficientemente polêmica para provocar reflexão: o fato é que praticamos o micronacionalismo do mesmo modo que o fazíamos há dez anos. A despeito da mudança no calendário, ainda fazemos o micronacionalismo do século passado.

De qual modo ficamos parados no tempo?

Primariamente, no sentido da compreensão do que é de fato o [micro-]nacionalismo. A idéia fixada por Reunião e Porto Claro, dos famosos “país-modelismo” de Aguiar ou “hobby” de Cláudio de Castro, continua a ser predominante na Lusofonia. Ainda é predominante o micronacionalismo como emulação – misto de hobby e diversão. E, nesse sentido, o micronacionalismo está em grande desvantagem contra as novas oportunidades de emulação que existem na rede.

Em 1997 o que havia de diversão interativa na Internet eram as salas de chat e o IRC. Nesse sentido o micronacionalismo tido como emulação era um competidor respeitável às mesmas. Hoje, entretanto, o micronacionalismo, se visto como emulação, tem de competir com o Second Life, World of Warcraft e similares. Quem está a procura de diversão, tende a ficar com estes últimos.

De tal feita, precisamos de uma revisão no conceito dado ao micronacionalismo. Isto, pois, para os que não conhecem o micronacionalismo, o formato no qual o mesmo é apresentado dá a impressão de algo como uma “brincadeira séria”, ou – “RPG de diplomacia”, como disse um amigo meu ao ser apresentado ao sítio de Pasárgada.

Ainda se tem receio de ver que a [micro-]nação somente diferem das outras em relação a sua escala. Aquele que estuda um pouco de teoria do nacionalismo, chega naturalmente à conclusão de que os variados conceitos de nação coincidem em uma coisa: se relaciona aos laços de identidade entre indivíduos, que se sentem ligados – ainda que não se conheçam – por meio de uma entidade imaginada denominada “nação”. São estes laços imaginados que fazem com que um catarinense e um potiguar sintam-se identificados com os mesmos símbolos nacionais: a bandeira, o hino, a história, o futuro. São os mesmos laços que fazem com que dois peruanos, ao se encontrarem na Europa, sintam-se “em casa”, ainda que longe de sua terra natal.

Nação não é um conceito que se relaciona, necessariamente, a determinado território. Os judeus na diáspora continuaram a manter características nacionais, entre eles a idéia de um passado e destino comuns. Do mesmo modo, um português no Brasil ainda faz parte de sua nação, ainda que no estrangeiro. Nação é um conceito imaginado.

Outrossim, falta às micronações assumirem, de fato, sua nacionalidade – não o conceito jurídico, mas o senso de pertencimento à nação. Ao se cultivarem os laços de nacionalidade, naturalmente, o senso de pertencimento do novato muda do eixo emulacionista para o realista/nacionalista. Naturalmente, os que buscam por emulação tendem a se desanimar. Por outra parte, aquele que busca por novas experiências, por uma evolução pessoal, por uma experiência nacional que seja diferente àquela das estruturas dos Estados-Nação tradicionais, poderá ser atraído. Alguns da extra-lusofonia já compreenderam isto, de certa maneira. O caso mais notável é o do Quinto Mundo (ver http://5world.net/ e http://groups.msn.com/FifthWorld). Falta-nos este passo.

Não obstante, é fato que os velhos e-mails não ajudam a construir a identidade nacional. Aí que entra o segundo ponto do novo micronacionalismo: precisamos aproveitar mais das novas tecnologias.

Se Pasárgada contribuiu paradigmaticamente para demonstrar que o micronacionalismo é feito de pessoas reais e que, por conseguinte, as relações sociais que aqui se dão também são reais, temos de ir além. É muito mais simples compreender esta realidade por meio de conferências de voz ou video-conferências do que por e-mail. E isto ainda acabaria com um velho problema do micronacionalismo: o paplismo.

E é interessante ver que a raíz deste pensamento já se encontrava, incrivelmente, no pensamento de Pedro Aguiar. Isto se fazia claro quando Aguiar dizia PC não estava “na Internet”, mas se utilizava da Internet. Do mesmo modo, precisamos nos utilizar de novos métodos, mas com um objetivo claro: não o de emular, mas o de reforçar a idéia de nação.

A mudança tecnológica não é uma mudança que vai somente transferir o problema da integração das listas de e-mail às novas tecnologias. Ao contrário, elas contribuem para melhorar os métodos de construção de um senso de pertencimento nacional. É por isso que sua adoção e essencial, desde que estejam orientados para o objetivo primaz de contrução da nação.

Expediente

Editor – Carlos Góes

Redação – Carlos Góes, Filipe Sales e Rodrigo Mariano.