Ausência e inatividade, conceitos distintos

01Abr08

The Reunion Times – Ano 1 – Número 1 – 19 de Outubro de 2006

AUSÊNCIA E INATIVIDADE: CONCEITOS DISTINTOS.
Filipe Sales

O micronacionalismo, ao longo de seus anos de existência, manteve uma vasta busca por soluções que nos abriguem da fragilidade e instabilidade inerente à qualquer atividade baseada na Internet e no voluntarismo. Diferente do que pregam a maioria dos grandes teóricos da Lusofonia, a idéia deste autor sobre o que nos diferencia de países juridicamente reais é que nos afastamos por estarmos sob um ambiente de voluntarismo.

Chegando à uma análise mais profunda e sincera, é óbvio que podemos chegar à conclusão de que não há qualquer obrigação decorrente de dever legal para qualquer participação dentro desta prática. Estamos, verdadeiramente, à mercê da sorte para com aqueles entre nós, pois um mero contra-tempo na vida pessoal de qualquer dos presentes na Lusofonia é motivo o suficiente para que esta simulação seja relegada à possibilidades futuras de retorno.

A inatividade, então, é o maior dos problemas que rodeiam o dia-a-dia do Estado virtual. Num ambiente onde a produção político-cultural é o fim último de todo sentido, a participação dos poucos que fazem parte deste sistema é o maior recurso existente, podendo ser comparado ao valor que as reservas financeiras possuem para os Estados juridicamente reais.

A fisiologia de uma micronação remete às primeiras noções de uma Associação, segundo as leis civis do mundo Ocidental moderno. Os Estados virtuais, da mesma forma que as associações, são organizações de pessoas reunidas intencionalmente ao redor de um objetivo único sem fins econômicos. O problema que aflige as associações é, pois, o mesmo que atinge as micronações: a escassez de recursos humanos.

Mas, diferente das associações, nos Estados virtuais, a inatividade de seus membros causa um problema ainda maior: a incerteza da legítima participação quando da aproximação de pleitos públicos. O caráter democrático das micronações acaba por ser sua maior fraqueza diante do desaparecimento de alguns e o reaparecimento às vésperas de eleições.

Mas o que é, em termos exatos, inatividade? É possível medi-la? A resposta à esta pergunta satisfaz apenas às necessidades mais imediatas dos Estados virtuais em relação à um problema que afeta também a legitimidade de seus pleitos públicos realizados.

Não há forma matemática de se medir a inatividade. Esta se caracteriza pela ausência de participação de determinada pessoa por um período considerável de tempo. Imagina-se que a participação de alguém pouco atento aos acontecimentos dentro de seu país virtual ronde em torno de algumas colocações por mês.

Destarte, podemos considerar a “atividade” como sendo a participação direta de alguém sobre os assuntos da polis virtual, enquanto a inatividade a ausência desta participação. Atividade não é, portanto, a simples postagem de mensagens. Atividade é a disponibilidade e participação do indivíduo nos assuntos públicos do Estado virtual. É sua colaboração. Do lado oposto, inatividade seria a inércia de alguém diante dos assuntos relacionados a uma micronação.Porque, ainda que se expresse, se não age, estaria inativo diante do micro-Estado.

Dissocia-se, portanto, em definitivo, inatividade de ausência. Enquanto o primeiro relaciona-se com a inércia do indivíduo diante dos assuntos inerentes a micronação, em sua esfera pública ou privada, o segundo refere-se a indisponibilidade de alguém para o meio micronacional, na maior parte do tempo, em razão de problemas pessoais ou de falta de acesso à Internet.

Nota-se a primeira observação do caráter peculiar da inatividade. Esta não se trata do desaparecimento do cidadão micronacional. Se trata, tão somente, de sua abstenção no tocante à movimentação política, social ou cultural. A inatividade não se trata, pois, de uma questão solucionável; é reflexo da liberdade de expressão do indivíduo contido dentro do ambiente virtual das micronações. Acompanhado de sua possibilidade de manifestação, vem a prerrogativa de que detém de optar pelo silêncio, pela mera observação. E, quanto à isto, o Estado não pode tomar ações.

A manifesta diferença entre a inatividade de um indivíduo e seu desaparecimento toma forma quando percebemos a existência de pessoas que se manifestam, prontamente, quando lhe são requisitadas, de forma que se torna perfeitamente possível de se provar que estão presentes, atentos, mas simplesmente escolheram pelo silêncio diante da produção político-cultural, o que lhes deve ser assegurado, pois sua contribuição pode ser, ainda que de forma não verbal, suficiente para que o Estado virtual possa ter melhores possibilidades de desenvolvimento.

Percebe-se que todo ausente é inativo, mas não é todo inativo que é ausente.

Ademais, a presença indelével de indivíduos que, permanente ou esporadicamente, se retiram para o status da observação, torna a questão da Inatividade uma situação inerente à própria prática do micronacionalismo, que nos acompanha desde a fundação das primeiras formas de Estado virtual, no apagar das luzes do século XX.

A noção, então, de que a inatividade seja prejudicial ao ambiente micronacionalismo é ilusória, pois a verdadeira patologia não se trata daquela, mas sim do desaparecimento do cidadão micronacional, de sua Ausência.

Finalmente, a impossibilidade do Estado virtual em agir no sentido de obrigar o inativo a permanecer mais presente à atividade da comunidade, sem que crie o ambiente propício à sua retirada, é prova contundente de que a ação neste sentido deve ser evitada e, ao contrário, valorizada como saída à necessidade brusca que alguns possuem de se retirar deste pequeno mundo em razão de problemas de ordem pessoal. É, pois, uma solução, e não um problema.

Obviamente, é mais interessante que alguém se retire temporariamente para a inatividade do que se torne, permanentemente, ausente de toda a sociedade.

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