{"version":"1.0","provider_name":"micropatriologia","provider_url":"http:\/\/micropatriologia.wordpress.com","author_name":"Carlos G\u00f3es","author_url":"https:\/\/micropatriologia.wordpress.com\/author\/goldsteincharles\/","title":"Concep\u00e7\u00f5es de nacionalismo","type":"link","html":"
O Socioculturalista #13, 5 de abril de 2008.<\/h5>\n
CONCEP\u00c7\u00d5ES DE NACIONALISMO – Carlos G\u00f3es<\/h5>\n

Pierre Renouvin e Jean-Baptiste Duroselle, em sua mais importante obra conjunta –\u00a0Introduction \u00e0 l’histoire des Relations Internationales\u00a0-, afirmam existir duas grandes abordagens anal\u00edticas do nacionalismo.<\/span>\u00a0Abordagens, ressalte-se, divergentes.<\/p>\n

A primeira seria a concep\u00e7\u00e3o\u00a0naturalista\u00a0do nacionalismo. Segundo esta concep\u00e7\u00e3o a na\u00e7\u00e3o seria um ser vivo, um ente natural, independente das rela\u00e7\u00f5es sociais existentes entre os membros da mesma. A na\u00e7\u00e3o estaria evidente na l\u00edngua, na ra\u00e7a, no territ\u00f3rio, na fidelidade, nos costumes, nas antigas tradi\u00e7\u00f5es. A na\u00e7\u00e3o seria a “a\u00e7\u00e3o inconsciente de uma for\u00e7a superior”. A qualifica\u00e7\u00e3o de um grupo social como na\u00e7\u00e3o n\u00e3o seria relacionado \u00e0 exist\u00eancia de um sentimento nacional, mas sim aos elementos como os supracitados. “Que tais agrupamentos n\u00e3o tenham consci\u00eancia de sua solidariedade, que n\u00e3o manifestem o desejo de viver em comum, pouco importa: os sinais exteriores constituem crit\u00e9rio indiscut\u00edvel”.<\/p>\n

Seriam exemplos o fato de\u00a0germ\u00e2nicos\u00a0terem se agrupado em um nacionalismo alem\u00e3o (ou germ\u00e2nico); antigos gauleses terem se tornado os contempor\u00e2neos franceses; e os habitantes da pen\u00ednsula it\u00e1lica terem, desde o S\u00e9culo XVI, fomentado um sentimento nacional italiano que culminaria na unifica\u00e7\u00e3o de 1870. N\u00e3o explicaria, todavia, o porqu\u00ea de a hispano-am\u00e9rica ter se conformado em um sem-n\u00famero de na\u00e7\u00f5es; e, por exemplo, o fato de os su\u00ed\u00e7os falantes do alem\u00e3o – muito similares culturalmente, linguisticamente e em termos \u00e9tnicos, dos alem\u00e3es – n\u00e3o conformarem a “na\u00e7\u00e3o germ\u00e2nica”, supostamente existente em termos naturais.<\/p>\n

J\u00e1 a concep\u00e7\u00e3o\u00a0sociol\u00f3gica\u00a0do nacionalismo compreende que a na\u00e7\u00e3o \u00e9 um “fato de consci\u00eancia”. A na\u00e7\u00e3o existe pelo fato de – agora utilizando o l\u00e9xico de B. Anderson [1] – seus membros identificarem um ao outro como ligados a uma mesma entidade\u00a0imaginada socialmente:\u00a0a na\u00e7\u00e3o<\/span>. “A p\u00e1tria \u00e9 antes de tudo a consci\u00eancia da p\u00e1tria”. \u00c9 marcante, nesse sentido, um famoso discurso de Ernest Renan, onde o mesmo relata que:<\/p>\n

Uma na\u00e7\u00e3o \u00e9 portanto uma grande solidariedade, constitu\u00edda pelo sentimento advindo dos sacrif\u00edcio que n\u00f3s fazemos e estamos dispostos a fazer no futuro. Ela pressup\u00f5e um passado resultante em um fato tang\u00edvel: o consentimento, o claro e expresso desejo de continuar a conviver em sociedade. A exist\u00eancia da na\u00e7\u00e3o \u00e9, em si mesma, um plebiscito di\u00e1rio, assim como a pr\u00f3pria exist\u00eancia do indiv\u00edduo \u00e9 uma perp\u00e9tua afirma\u00e7\u00e3o da vida [2].<\/p>\n

De tal modo, mesmo reconhecendo a import\u00e2ncia dos fatores tidos como fontes\u00a0naturais<\/span>\u00a0da na\u00e7\u00e3o para a emerg\u00eancia de um sentimento nacional, eles por si s\u00f3 n\u00e3o seriam suficientes. Sem a\u00a0express\u00e3o<\/span>\u00a0de uma identidade comum, de um sentimento de solidariedade, n\u00e3o pode haver na\u00e7\u00e3o. Isto, pois a\u00a0na\u00e7\u00e3o<\/span>\u00a0seria constitu\u00edda exatamente por esta identifica\u00e7\u00e3o coletiva sendo, assim, uma comunidade imaginada.<\/p>\n

Ao passo que a concep\u00e7\u00e3o\u00a0naturalista\u00a0entende que a na\u00e7\u00e3o \u00e9 um\u00a0fato dado<\/span>, emp\u00edrico, a concep\u00e7\u00e3o\u00a0sociol\u00f3gica\u00a0trata da quest\u00e3o das identidades, sendo a na\u00e7\u00e3o \u00e9 constru\u00edda sociologicamente, por meio das intera\u00e7\u00f5es sociais. Na primeira abordagem, a exist\u00eancia de uma microna\u00e7\u00e3o seria imposs\u00edvel, uma vez que microna\u00e7\u00f5es n\u00e3o s\u00e3o\u00a0natural: n\u00e3o se baseiam ou resumem \u00e0 l\u00edngua ou \u00e0 etnia.\u00a0Todavia, concebendo a na\u00e7\u00e3o como ente constru\u00eddo com base nas intera\u00e7\u00f5es sociais, pode-se observar que um microna\u00e7\u00e3o pode ter, apesar da escala reduzida, as mesmas caracter\u00edsticas de uma na\u00e7\u00e3o de propor\u00e7\u00f5es maiores.<\/p>\n

Nesse sentido, fica exposta exatamente qual deveria ser a abordagem micronacional \u00e0 quest\u00e3o da constru\u00e7\u00e3o de um micro-nacionalismo: deve-se focar nos la\u00e7os imaginados de identidade que emergem das intera\u00e7\u00f5es sociais. Microna\u00e7\u00f5es possuem um\u00a0locus\u00a0social. As rela\u00e7\u00f5es existentes, ainda que utilizando-se da Internet como meio de comunica\u00e7\u00e3o, s\u00e3o reais, nunca virtuais.<\/p>\n

[*] cita\u00e7\u00f5es, salvo expresso em contr\u00e1rio: RENOUVIN, Pierre; DUROSELLE, Jean-Baptiste.\u00a0Introduction \u00e0 l’histoire des Relations Internationales. Paris: Librairie Armand Colin, 1967. pp. 180 – 267.
\n[1] V. ANDERSON, Benedict. Comunidades Imaginadas: Reflex\u00f5es sobre a origem e a expans\u00e3o do Nacionalismo.<\/span><\/span><\/p>\n"}